sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010
Fernando Pessoa: Viver não é necessário, necessário é criar
Várias vezes penso que é mais complexo - e muito menos poético- o que se escreve sobre as obras dos escritores e pensadores...
Para mim, infelizmente, os textos técnicos e pomposos de "catedráticos" me afastaram muito tempo de grandes escritores, entre eles Kafka e Voltaire.
Neste mesmo sentido passei anos da minha vida ouvindo o que Fernando Pessoa poderia querer dizer sobre a frase: "Navegar é preciso, viver não é preciso". Há várias teorias sobre precisão: necessidade ou rigor na medida?
Então, quando pesquisava para uma apresentação sobre o poeta foi uma surpresa divertida encontrar esse poema dele...Deixo para você conferir:
"Navegar é Preciso
Navegadores antigos tinham uma frase gloriosa:
"Navegar é preciso; viver não é preciso".
Quero para mim o espírito desta frase,
transformada a forma para a casar como eu sou:
Viver não é necessário; o que é necessário é criar.
Não conto gozar a minha vida; nem em gozá-la penso.
Só quero torná-la grande,
ainda que para isso tenha de ser o meu corpo e a (minha alma) a lenha desse fogo.
Só quero torná-la de toda a humanidade;
ainda que para isso tenha de a perder como minha.
Cada vez mais assim penso.
Cada vez mais ponho da essência anímica do meu sangue
o propósito impessoal de engrandecer a pátria e contribuir
para a evolução da humanidade.
É a forma que em mim tomou o misticismo da nossa Raça.
Nota:
"Navigare necesse; vivere non est necesse" - latim, frase de Pompeu, general romano, 106-48 aC., dita aos marinheiros, amedrontados, que recusavam viajar durante a guerra, cf. Plutarco, in Vida de Pompeu]
Fernando Pessoa: 72 poetas num só...
No Saurau da Casa da Ponte de Janeiro/2010 iniciei um projeto de homenagear um poeta por mês e como primeira escolha o fazemos àquele que nos toca mais a alma, não poderia deixar de ser FERNANDO PESSOA, para mim o melhor...
Se não concorda com minha opinião, mas há de concordar que definitivamente o maior ele foi, posto que foi 72 heterônimos, sendo os mais famosos: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Segue um texto de explicação transcrito com as palavras do poeta:
"Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre: Albert Caeiro. Foi essa a sensação imediata que tive...
... Aparecido Alberto Caeiro tratei logo de lhe descobrir –instintiva e subconsciente - uns discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome e ajustei-o a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, em derivação oposta à de Ricardo Reis, surgiu-me impetuosamente um novo indivíduo. Num jacto, e á máquina de escrever, sem interrupção nem emenda, surgiu a Ode Triunfal de Álvaro de Campos - a ode com esse nome e o homem com o nome que tem.
...E parece que tudo se passou independente de mim. E parece que ainda se passa...”
Meu preferido é Álvaro de Campos, como diz o poeta(o mais histericamente histérico de mim). Segue uma poesia dele que declamei, das minhas favoritas, que declamei no sarau:
Lisbon revisited (1923)
NÃO: Não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) —
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-na!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer coisa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que havemos de ir juntos?
...
Janeiro 2010: 4° Sarau Casa da Ponte
Ando numa fase atropelada de mudanças, pensares e fazeres e o deus Cronos, apesar dos meus inúmeros pedidos, não aumentou meu tempo para 48 horas diárias e nem o restante do Olimpo concordou em fazer 2 cópias minhas...daí perdoem-me a ausência, os deuses é que foram impiedosos...
Mesmo assim a vida não parou e no dia 29 de janeiro deste tivemos um sarau onde especialmente tivemos o lançamento, em primeira mão, do novo livro de poesias: CANTARIA da nossa grande poeta: AGLAIA SOUZA.
E tivemos leituras de poemas e textos por: Basilina Pereira, Rai oliveira, Roberto Klotz, Edson Alves, Eusanete Sant'Anna, Ana Guimarães, Nando Negreiros e Aldmeriza Rilker.
Além disso fiz uma apresentação breve sobre Fernando Pessoa,iniciando o meu novo Projeto: Uma noite com o poeta...
Deixo, do seu novo livro, um belo poema da Aglaia:
REDEMOINHO
Não vá - eu te quero.
Exorcize esse medo
me arraste nos braços
me leve no vento
que agitas tão forte
quando passas de manso
e deixas teu cheiro
redemoinhando no ar.
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